quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Reformas Pombalinas, Primeiras Contestações ao Sistema Colonial e Fixação de Limites entre Portugal e Espanha


tratado portugal
A crise do Antigo Regime – O declínio da mineração no Brasil coincide, no plano internacional, com a crise do Antigo Regime. Fazendo um balanço de toda a exploração colonial do Brasil, chegamos à melancólica conclusão de que Portugal não foi o principal beneficiário da exploração colonial.

          Os benefícios da colonização haviam se transferido para outros centros europeus em ascensão: França e, em especial, Inglaterra. De fato, o século XVIII teve a Inglaterra como centro da política internacional e pivô das mudanças estruturais que começavam a afetar profundamente o Antigo Regime. Como nação vitoriosa na esfera econômica, a Inglaterra estava prestes a desencadear a Revolução Industrial, convertendo-se na mais avançada nação burguesa do planeta.

A visível transformação econômica foi acompanhada, na segunda metade do século XVIII, por uma ebulição no nível das idéias. Surgiu o Iluminismo e, com essa filosofia, uma nova visão do homem e do mundo. Por trás de todo esse movimento, encontrava-se a burguesia, comandando a crítica ao Antigo Regime e, portanto, à nobreza e ao absolutismo.
Mas os filósofos iluministas, como Voltaire e Diderot, seduziram os monarcas absolutistas da Prússia, Áustria, Rússia, Portugal e Espanha. Sem abrir mão do absolutismo, esses monarcas realizaram algumas das reformas recomenda­das pelos iluministas, que vieram reforçar o seu poder, uma vez que a modernização empreendida aliviou as tensões sociais. Por se manterem absolutistas e optarem por reformas modernizadoras, aqueles monarcas ficaram conhecidos como déspotas esclarecidos. Esse foi um fenômeno típico da segunda metade do século XVIII.
D. José I (1750-1777) e seu ministro, o mar­quês de Pombal, foram os representantes do despotismo esclarecido em Portugal.

Reformas Pombalinas
As reformas pombalinas – No reinado de D. José I, o ministro Sebastião José de Carvalho, marquês de Pombal, com sua forte personalidade, caracterizou o período, denominado em virtude disso “pombalino”.
O período pombalino coincidiu com a época da decadência da mineração, e todo o esforço político do ministro de D. José I concentrou-se na tentativa de modernização do rei­no. Mas essa modernização, como era típico dos déspotas esclarecidos, foi imposta de cima para baixo.
Considerando as suas realizações em conjunto, conclui-se que a política de Pombal tinha em vista, de um lado, o fortalecimento do Estado e, de outro, a autonomia econômica de Portugal.
No primeiro caso, Pombal tratou de diminuir a influência da nobreza e sobretudo dos jesuítas, os quais expulsou de Portugal e de to­dos os seus domínios em 1759.
Quanto à autonomia econômica, o seu objetivo era o de tirar o país da órbita inglesa, na qual ingressara a partir de meados do século XVII.
Desde o fim da União Ibérica em 1640, o Brasil era a mais valiosa possessão portuguesa. Com a descoberta e a exploração do ouro em Minas, o Brasil ocupou o lugar indiscutível de retaguarda econômica da metrópole. Porém, no tempo de Pombal, a mineração encontrava-se em franca decadência. A sua preocupação foi então a de reorganizar a administração colonial, fortalecer os laços do exclusivo metropolitano, a fim de garantir o máximo de transferência da riqueza brasileira para Portugal.
Em sua política colonial, Pombal tratou de centralizar a administração para maior controle metropolitano. Nesse terreno, o ministro tomou duas medidas importantes. A primeira foi a extinção do regime de capitanias hereditárias e, portanto, o fim do poder dos donatários. A segunda foi a reunificação administrativa.
Com essa reunificação ficava abolida a antiga divisão administrativa estabelecida em 1621, quando então o Brasil ficou dividido em dois Estados: o Estado do Maranhão e o do Brasil, cada qual com um governador próprio. O primeiro abrangia Pará, Maranhão e Ceará e o segundo, os demais territórios ao sul. A capital do Estado do Maranhão era São Luís e a do Estado do Brasil era a Bahia.
Pombal reunificou a administração, transferindo, ao mesmo tempo, a capital para o Rio de Janeiro, em 1763, o que mostrou a sua preocupação em manter a cabeça administrativa bem próxima da economia mineira.
Mas a sua política não estava concentrada apenas em Minas. Ela abrangia também a economia açucareis do nordeste e a exploração das “drogas do sertão” da região amazônica.
Em relação a Minas, com a finalidade de as­segurar os rendimentos da Coroa, Pombal tomou a iniciativa de converter a exploração diamantífera em monopólio real, com o Regi­mento da Real Extração e, em relação ao ouro, ele estabeleceu um regime de taxação que combinava a Casa de Fundição e o sistema de fintas com cotas de 100 arrobas, complementado pela derrama.
Para atuar no nordeste e na região amazônica, Pombal criou a Companhia Geral do Comércio do Grão Pará e Maranhão (1755) e a Companhia Geral do Comércio de Pernambuco e Paraíba (1759).
Assim, o quadro geral da administração colonial caracterizou-se, no final do século XVIII, pela crescente racionalização da atividade econômica, tendo por objetivo a transferência do máximo de riqueza do Brasil para Portugal. Paralelamente a essa racionalização, aumentava também o grau de opressão colonial. Essa tendência continuou com D. Maria I, que sucedeu a D. José I. No seu reinado, através do Alvará de 1785, proibiu-se a atividade manufatureira no Brasil.

Contestações ao Sistema Colonial

Contradições do sistema colonial – O sistema colonial possuía dois eixos contraditórios. De um lado, senhores e escravos; de outro, colônia e metrópole.
No Brasil, esse sistema ganhou a forma típica de escravismo colonial, e esse caráter simultaneamente escravista e colonial não foi desfeito ao mesmo tempo. Primeiro, rompe­ram-se os laços coloniais e, muito mais tarde, aboliu-se a escravidão.
Alguns historiadores, em data mais recente, afirmaram que o escravismo, e não o caráter colonial, vem a ser o traço definidor mais importante da sociedade. Por isso não dão muita importância à independência do Brasil. Para eles, o fato decisivo é a abolição da escravidão, em 1888. E um exagero: a superação da ordem colonial (o processo de independência) foi um fenômeno de grande importância e não tem sentido minimizá-lo em favor de outro, que foi a abolição da escravatura.
De fato, nas inúmeras rebeliões ocorridas antes da independência, raras foram as que colocaram em xeque o escravismo. A maioria contestava diretamente o regime colonial a que o Brasil estava submetido, e muitas pessoas arriscaram a própria vida para aboli-lo. E isso tem a sua importância histórica. Ninguém estava lutando contra uma ficção, mas contra algo muito real: a opressão e exploração coloniais.
No entanto, aqueles historiadores não deixam de ter razão. Se prestarmos atenção apenas à luta pela emancipação, deixamos de lado as camadas populares e os escravos, pois a obra emancipadora foi, no Brasil, produto das elites. Não se deve esquecer que os de baixo estavam tão insatisfeitos com o regime colonial quanto com a dominação dos senhores de es­cravos.
Tendo em vista, portanto, essa dupla contradição do sistema colonial, examinemos o processo emancipacionista.
A primeira constatação importante é a de que o rompimento dos laços coloniais decorreu do próprio funcionamento do sistema: para explorar a colônia é preciso, antes de tudo, desenvolvê-la. Porém, à medida que a colônia se desenvolve, engendra interesses próprios que passam a divergir dos da metrópole. Esse é o momento em que os próprios colonos tomam consciência da exploração e de si próprios como colonos. Por isso mesmo, serão os integrantes da camada dominante os primeiros a alcançarem de forma aguda essa consciência e, em regra, serão eles os dirigentes desse movimento de emancipação.
Isso não impediu, todavia, que as contradições sociais internas da colônia se aguçassem paralelamente à luta contra a metrópole, de modo que a ruptura dos laços coloniais pode­ria ser acompanhada, ao menos como possibilidade, de uma convulsão social.
Examinando em conjunto o processo emancipacionista da América, verifica-se que, em geral, a independência não se fez acompanhar de uma revolução social. A única exceção foi o Haiti, colônia francesa que, em 1792, libertou-se da metrópole através de uma vasta rebelião escrava, extinguindo, ao mesmo tempo, a escravidão. Nos demais países, a independência não alterou em nada a estrutura social, que, no caso brasileiro, era escravista. Porém, isso não significa que a possibilidade de uma revolução social não es­teve presente, de modo quase permanente, nas revoltas anticolonialistas.

O sentido das rebeliões coloniais – As primeiras rebeliões anticolonialistas surgiram nos fins do século XVII e início do seguinte e foram resultado direto da nova política colonial adotada por Portugal depois da Restauração (1640). Nesse contexto, as contradições entre metrópole e colônia se manifestaram de diversas maneiras: de um lado, como protesto ao regime comercial monopolista, como na Revolta de Beckman (1684), no Maranhão; de outro, como uma guerra entre senhores e escravos fugitivos, como em Palmares (1694), em Alagoas; mas também como conflito entre senhores de engenho e mercadores, como na Guerra dos Mascates (1709-1711), em Pernambuco; e, enfim, como reação à opressão fiscal, exemplificada pela Revolta de Vila Rica (1720), em Minas.
Todas essas rebeliões tiveram por base a contradição metrópole-colônia e, no caso de Palmares, senhores-escravos. Entretanto, cada rebelião possuía o seu caráter específico e apresentou grande complexidade.
Porém, as rebeliões coloniais até o início do século XVIII não chegaram a propor claramente a emancipação política como solução. Elas só terão esse caráter com a Inconfidência Mineira (1789) e a Conjuração Baiana ou dos Alfaiates (1798).
As primeiras manifestações anticolonialistas. Nos primeiros tempos da colonização, a contradição entre metrópole e colônia era latente e existia apenas em potencial. Na realidade, a colônia era vista como um prolongamento da metrópole, e os interesses não eram, de início, conflitantes. Na fase da montagem da economia colonial inexistia, na prática, divergências entre colonos e o Estado metropolitano. Porém, à medida que o processo coloniza­dor avançou e se consolidou, os interesses tornaram-se conflitantes.
Ora, isso é perfeitamente compreensível, pois a metrópole não tem o que explorar se a riqueza não for produzida. Uma vez produzida, a luta pela sua posse é desencadeada.
Na segunda metade do século XVII, com a Restauração (1640) e a expulsão dos holandeses (1654), a divergência de interesses entre colônia e metrópole tornou-se evidente. A opressão colonial começou a ser sentida com a criação das Companhias de Comércio, às quais a metrópole concedeu monopólio do comércio colonial. A própria administração portuguesa ganhou um novo contorno com a criação do Conselho Ultramarino.
Assim, à medida que o Estado português torna-se clara e conscientemente colonialista, no Brasil desenvolve-se uma consciência anticolonialista.

Revolta de Beckman (1684) – Em meados do século XVII, o Maranhão estava com problemas devido à dificuldade de escoar a sua produção e de obter gêneros metropolitanos e, sobretudo, escravos.
A criação da Companhia do Comércio do Estado do Maranhão em 1682, que tinha por objetivo precisamente resolver tais problemas, veio agravar ainda mais a situação. Em princípio, essa companhia deveria não apenas adquirir a produção açucareis como também fornecer gêneros metropolitanos e es­cravos. Porém, visto que a ela fora concedido o monopólio tanto da venda de escravos e produtos metropolitanos, como da compra do açúcar, os colonos ficaram sujeitos aos preços arbitrariamente estabelecidos pela companhia, o que já era motivo de insatisfação. Essa insatisfação converteu-se em aberta rebelião porque, além disso, a companhia não cumpriu o seu compromisso de abastecer adequadamente o Maranhão com bens metropolitanos e escravos.
A revolta eclodiu em 1684 liderada por Manuel Beckman, um abastado senhor de engenho. Os revoltosos propunham a abolição do monopólio da companhia e uma relação comercial mais justa. Em sinal de protesto, o governo local foi deposto, os armazéns da companhia saqueados e os jesuítas, velhos inimigos dos colonos por impedirem a escravização do índio, foram expulsos.
Sob a direção de Manuel Beckman foi composto um governo provisório, e seu irmão, Tomás Beckman, foi enviado a Lis­boa para apresentar as reivindicações dos revoltosos. Estas não foram atendidas e Tomás Beckman foi preso e recambiado para o Brasil, na frota em que veio o novo governador, Gomes Freire de Andrade. Este desembarcou no Maranhão, onde foi recebi­do com obediência, e, em seguida, reconduziu as autoridades depostas. Manuel Beckman fugiu e quando planejava libertar o irmão do cárcere foi traído por um afilhado. Beckman foi preso e executado.
Apesar do fracasso, esse foi o primeiro movimento anticolonial organizado, embora não tivesse ocorrido aos dirigentes do movi­mento a independência da colônia em relação a Portugal, ou seja, a condição colonial não foi questionada.
Quilombo dos Palmares (1630-1694) – No Brasil, a exploração colonial resumia-se, em última análise, na exploração do trabalho escravo pelo senhor. Devido ao caráter colonial dessa exploração, é verdade que o próprio senhor não ficava com todo o produto do trabalho escravo. Boa parte da riqueza ia para o Esta­do na forma de impostos e, também, para os cofres dos comerciantes portugueses. Daí a razão da revolta dos senhores contra o sistema colonial e as autoridades que o representavam. Mas não es apenas a camada dominante que se rebelava. Também os escravos elaboraram meios de resistir contra o seu opressor imediato, isto é, o senhor.
A resistência dos escravos assumiu formas muito variadas: fuga, suicídio, assassinato, passividade no trabalho, etc. Em qualquer uma dessas formas, o escravo negava a sua condição e se contrapunha ao funcionamento do sis­tema como um todo.
A fuga, entretanto, foi a mais significativa forma de resistência e rebeldia. Não pela fuga em si, mas pelas suas conseqüências: os fugitivos se reuniam e se organizavam em núcleos fortificados no sertão, desafiando as autoridades coloniais. Observemos que, no combate à rebeldia escrava, aliavam-se senhores e autoridades coloniais.
Esses núcleos eram formados por pequenas unidades, os mocambos (reunião de casas), que, no conjunto, formavam os quilombos. Cada mocambo possuía um chefe, que, por sua vez, obedecia ao chefe do quilombo, denominado zumbi. Os moradores dos quilombos eram conhecidos como quilombolas. Eles se dedicavam ao trabalho agrícola e chegavam a estabelecer relações comerciais com os povoa­dos vizinhos.
Palmares foi o maior quilombo formado no Brasil. Localizava-se no estado atual de Alagoas e deve o seu nome à grande quantidade de palmeiras existentes na região.
Sua origem situa-se no início do século XVII, mas foi a partir de 1630, quando a conquista holandesa desorganizou os engenhos, que a fuga maciça de escravos tornou Palmares um quilombo de grandes proporções. Em 1675, a sua população foi avaliada em 20 ou 30 mil habitantes.
Com a expulsão dos holandeses em 1654 e a escassez de mão-de-obra aliada ao fato de Palmares funcionar como pólo de atração para outros escravos, estimulando a sua fuga, as autoridades coloniais, apoiadas pelos senhores, decidiram pela sua destruição. Várias expedições foram feitas contra ele, mas nenhuma delas teve sucesso. Foram contratados então os serviços de um veterano bandeirante, Domingos Jorge Velho. Apoiado por abundante material bélico e homens, o bandeirante contratado conseguiu finalmente destruir Palmares em 1694. Todavia, o chefe do quilombo, Zumbi, não foi capturado na ocasião. Somente um ano depois foi encontrado e executado.

Guerra dos Mascates (1709-1711) – A Guerra dos Mascates ocorreu em Pernambuco e, aparentemente, foi um conflito entre senhores de engenho de Olinda e comerciantes do Recife. Estes últimos, denominados “mascates”, eram, em sua maioria, portugueses.
Antes da ocupação holandesa, Recife era um povoado sem maior expressão. O principal núcleo urbano era Olinda, ao qual Recife encontrava-se subordinado.
Porém, depois da expulsão dos holandeses, Recife tornou-se um centro comercial, graças ao seu porto excelente, e recebeu um grande afluxo de comerciantes portugueses.
Olinda era uma cidade tradicionalmente do­minada pelos senhores de engenho. O desenvolvimento de Recife, cidade controlada pelos comerciantes, testemunhava o crescimento do comércio, cuja importância sobrepujou a atividade produtiva agroindustrial açucareis, à qual se dedicavam os senhores de engenho olindenses.
O orgulho desses senhores havia sido abala­do seriamente desde que a concorrência anti­lhana havia colocado em crise a produção açucareis do nordeste. Mas ainda eram poderosos, visto que controlavam a Câmara Municipal de Olinda.
À medida que Recife cresceu em importância, os mercadores começaram a reivindicar a sua autonomia político-administrativa, procurando libertar-se de Olinda e da autoridade de sua Câmara Municipal. A reivindicação dos recifenses foi parcialmente atendida em 1703, com a conquista do direito de representação na Câmara de Olinda. Entretanto, o forte controle exercido pelos senhores sobre a Câmara tornou esse direito, na prática, letra morta.
A grande vitória dos recifenses ocorreu com a criação de sua Câmara Municipal em 1709, que libertava, definitivamente, os comerciantes da autoridade política olindense. Inconformados, os senhores de engenho de Olinda, utilizando vários pretextos (a demarcação dos limites entre os dois municípios, por exemplo), re­solveram fazer uso da força para sabotar as pretensões dos recifenses. Depois de muita luta, que contou com a intervenção das autoridades coloniais, finalmente em 1711 o fato se consumou: Recife foi equiparada a Olinda. Assim ter­minou a Guerra dos Mascates.
Com a vitória dos comerciantes, essa guerra apenas reafirmava o predomínio do capital mercantil (comércio) sobre a produção colonial. E isso já era fato, uma vez que os senhores de engenho eram freqüentemente devedores dos mascates. Portanto, a equiparação política das duas cidades tinha fortes razões econômicas e obedecia à lógica do sistema colonial.

A Expansão Colonizadora e a Fixação dos Limites


Tratados luso-espanhóis – Portugal e a Espanha, os pioneiros da expansão ultramarina, a fim de garantir a possessão dos territórios descobertos recorreram à autoridade do papa para legitimá-los. Assim, no Ocidente foi estabelecido inicialmente a Bula Inter-Coetera (1493), um meridiano que passava a 100 léguas a oeste de Cabo Verde dividindo domínios portugueses e espanhóis. O meridiano da Bula Inter-Coetera não permitia a inclusão do Brasil como domínio português. No ano seguinte, uma nova divisão foi negociada, dando origem ao Tratado de Tordesilhas (1494), que estipulou um meridiano a 370 léguas a oeste de Cabo Verde, ampliando o domínio português, incluindo desta vez parte do que seria mais tarde o Brasil.
Não tardou que a emergência de novas potências européias (Holanda, França, Inglaterra) viesse a contestar a partilha do mundo pelas nações ibéricas. Assim, a alteração do quadro internacional no início do século XVI forçou Portugal e a Espanha a adotarem uma atitude mais efetiva em relação à América. A colonização, como vimos, viabilizou a posse efetiva.

A ocupação do litoral: a expansão oficial – Mesmo depois de decidida a ocupação efetiva do Brasil pela colonização, o litoral não deixou de ser constantemente ameaçado, principalmente pelos franceses. A dificuldade em desalojá-los foi devida, em grande parte, à sua aliança com os tupinambás, inimigos mortais dos tupiniquins, aliados dos portugueses. Por isso, a conquista do litoral deveu-se à conjugação de ações militares e religiosas. Através das primeiras repelia-se o rival e, em seguida, fundava-se um forte para guarnecer a região. Depois eram enviadas missões religiosas a fim de pacificar os indígenas. Porém, quando estes se mostravam excessivamente rebeldes, utilizava-se a força pura e simples para reduzi-los à submissão.
À medida que a colonização avançava, os franceses foram sendo repelidos para o norte, onde procuravam ainda extrair o pau-brasil. Assim, sucessivamente foram sendo conquistados Sergipe del Rei, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará, Maranhão e, finalmente, o Grão­Pará, cuja conquista completa dar-se-ia somente em meados do século XVII. Antes, porém, de serem repelidos para o Pará, os franceses tentaram ainda fundar no Maranhão a França Equinocial, em 1612, erguendo o for­te de São Luís, num derradeiro esforço para preservar uma colônia no Brasil. Depois da conquista do Pará, os franceses finalmente iriam se estabelecer nas Guianas, onde não foram mais molestados.
No sul, Portugal fundou em 1680 a Colônia do Sacramento, na margem esquerda do rio da Prata, para se contrapor a Buenos Aires do outro lado do estuário do rio. Nessa área, aliás, iria se desenrolar um intenso conflito entre portugueses e espanhóis, além da intervenção de outras potências, como França e Inglaterra, em virtude da posição estratégica do rio dá Prata, cuja livre navegação era defendida por várias nações.

Povoamento do Brasil até meados do século XVII – A colonização do Brasil, que teve como fundamento a agroindústria açucareira, possibilitou a ocupação efetiva do litoral. Durante muito tempo, segundo a expressão famosa de frei Vicente do Salvador, que viveu no século XVII, os colonos limitavam-se a “andar arranhando as terras ao longo do mar como caranguejos”.
A interiorização da colonização, entretanto, iniciou-se com o desenvolvimento da pecuária nordestina, que foi gradualmente se afastando do litoral açucareiro que lhe dera origem. Seus focos de irradiação foram Bahia e Pernambuco. Seguindo as margens dos rios, o gado iria possibilitar o povoamento do sertão de Pernambuco, Bahia, Alagoas, Sergipe, Rio Grande do Norte, Ceará, Paraíba e Maranhão.
Outro importante fator de ocupação do interior foi o bandeirismo, o responsável pela incorporação da maior parcela territorial pertencente à Espanha ao domínio português. O bandeirismo foi um fenômeno tipicamente paulista.
A capitania de São Vicente, apesar do relativo sucesso no começo da colonização, terminou por mergulhar num estado de profunda pobreza por causa de sua posição excêntrica em relação ao pólo dinâmico do nordeste. A falta de contato com a metrópole estimulou os vicentinos a entrarem para o interior depois de subir a serra do Mar e atingir o planalto de Piratininga. A principio, tratava-se de encontrar o ouro ou a prata. É a fase do bandeirismo do ouro de lavagem. No início do século XVII, os holandeses ocuparam o nordeste e estenderam o seu domínio sobre a África portuguesa, desencadeando uma crise de mão-de-obra na parte portuguesa do Brasil. Os engenhos da Bahia passaram a ter dificuldades de re­posição de seu estoque de escravos. Para atender a essa procura, os bandeirantes voltaram-se para a captura de índios, dando origem ao bandeirismo de preação. Essa fase culminou com os ataques às missões jesuíticas espanholas do Tape, Itatim e Guairá. Nessas missões (aldeamento de índios para a catequese), havia um número considerável de índios guaranis. Esses aldeamentos foram estabelecidos com o consentimento do rei espanhol, que via neles uma forma de preservar o domínio territorial sulino que lhe pertencia por força do Tratado de Tordesilhas. Contudo, a reunião dos índios nessas reduções atraiu os bandeirantes, que, num único ataque, conseguiam mão-de-obra abundante e já disciplinada pelos jesuítas.
O bandeirismo de preação entrou em declínio tão logo os holandeses foram expulsos e as posições portuguesas na África recuperadas, regularizando o abastecimento de escravos. A partir disso, o bandeirismo tornou a se redefinir.
De fato, na segunda metade do século XVII, ao mesmo tempo em que aumentavam a exploração e a opressão coloniais, ficava evidente a divergência de interesses entre metrópole e colônia. Na colônia aumentou a tensão entre escravos e grandes proprietários. Na época da conquista holandesa, ocorreram fugas em massa de escravos, que formaram o mais famoso quilombo, o de Palmares, em Alagoas. Da mesma forma, os indígenas oprimidos organizaram no Rio Grande do Norte a Confederação dos Cariris. Para destruir esses focos de rebelião, os grandes proprietários do nordeste recorreram a esses rústicos bandeirantes que agora passaram a ser utilizados como força repressora. Teve início aí o sertanismo de contrato, a última forma e fase do bandeirismo. Para destruir a resistência do Quilombo dos Palmares e da Confederação dos Cariris foram contratados os serviços de Domingos Jorge Velho.

A mineração e o povoamento do Brasil central – Com a mineração deu-se o passo decisivo na ocupação do interior. Com a descoberta de ouro nas Gerais, o centro dinâmico da economia deslocou-se do litoral nordestino para. o centro-sul do Brasil. Além de propiciar a formação de um mercado interno, o pólo minerador serviu de elemento articulador da economia colonial, através da pecuária nordestina e sulina. Esta última, ao se desenvolver e se articular com os centros mineiros, criou condições para a efetiva ocupação do Rio Grande do Sul.

A colonização do extremo norte; o vale amazônico – A colonização da Amazônia – que hoje corresponde aos estados do Amazonas e do Pará – foi estimulada pelas preocupações de garantir a posse e o acesso ao rio Amazonas e impe­dir a presença de rivais de outros países. A base de ocupação se deu através do extrativismo vegetal e do apresamento indígena.
O extrativismo vegetal consistiu na exploração das chamadas “drogas do sertão”: cacau, guaraná, borracha, urucu, salsaparrilha, castanha-do-pará, gergelim, noz de pixurim, baunilha, coco, etc. Por isso, a escravidão tinha ali um terreno desfavorável, pois a exploração da Amazônia dependia do bom conhecimento da região. Daí a importância dos índios locais que serviam de guias. A forma predominante que caracterizou a integração da Amazônia ao conjunto da economia colonial foi o estabeleci­mento das missões jesuíticas, que chegaram a aldear perto de 50 mil índios.

A Fixação das Fronteiras


Os tratados de limites – Nos fins do século XVIII, o atual território brasileiro estava praticamente formado. Para isso contribuíram a pecuária, o bandeirismo, a mineração e as missões jesuíticas no vale amazônico.
Os limites no extremo norte foram discuti­dos com os franceses, que haviam se fixado nas Guianas, e no extremo sul, com os espanhóis. A essa altura, estava claro que o meridiano de Tordesilhas já não podia ser tomado como referência para delimitar os domínios portugueses e espanhóis.
No século XVIII e no princípio do XIX, vários tratados foram assinados pelos portugueses para definir os limites.
O primeiro tratado de limites ocorre com o Primeiro Tratado de Utrecht (1713). Por esse tratado a França reconheceu o direito exclusivo de Portugal navegar no rio Amazonas, em troca do reconhecimento português da posse da Guiana pelos franceses. Pelo Segundo Tratado de Utrecht (1715), a Espanha reconheceu a possessão da Colônia do Sacramento (fundada em 1680) por Portugal, mas não de forma definitiva. Outros tratados foram assinados entre Portugal e Espanha para a fixação dos limites no extremo sul.
Em 1750, a questão começou a ser re­discutida, resultando no Tratado de Madri (1750). Segundo esse novo tratado, ficou estabelecido o princípio do uti possidetis, isto é, Portugal e a Espanha estabeleceram como critério a ocupação efetiva. Assim, territórios ocupa dos por portugueses foram reconhecidos pela. Espanha como portugueses, e reciprocamente. Com esse tratado foram formalmente invalida­dos os limites estabelecidos pelo Tratado de Tordesilhas. A Espanha, a fim m de assegurar a navegação exclusiva no rio da Prata, trocou a Colônia do Sacramento pelos Sete Povos das Missões (referência às sete missões jesuíticas espanholas que correspondiam, grosso modo, ao atual esta do Rio Grande do Sul).
Entretanto, o acordo estabelecido pelo Trata do de Madri não foi cumprido, devido à recusa dos jesuítas espanhóis em entregarem os Sete Povos das Missões aos portugueses. Instigados pelos jesuítas, os indígenas moveram uma guerra contra os novos ocupantes, as Guerras Guaraníticas, que se prolongaram até 1767.
Por essa razão, o ministro português, mar­quês de Pombal, decidiu anular essa cláusula do Tratado de Madri e se negou a entregar a Colônia do Sacramento, levando os países ibéricos a anularem o tratado anterior, o que se deu com o Tratado do Pardo (1761).
As negociações continuaram com o Trata­do de Santo Ildefonso (1777), com Portugal renunciando à região dos Sete Povos e ao Sacramento, em troca da ilha de Santa Catarina, então pertencente à Espanha. A situação só iria se definir, finalmente, em 1801, com o Tratado de Badajós, depois da destruição dos Sete Povos pelos gaúchos. Retornando aos termos do Tratado de Madri, Portugal reconheceu a posse do Sacramento e ficou com os Sete Povos.
Bibliografia:
História do Brasil – Luiz Koshiba – Editora Atual
História do Brasil – Bóris Fausto – EDUSP

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