Quando nós, policiais, falamos em eleições, nos interessa logo saber as propostas dos candidatos para a questão salarial e algo um tanto genérico que chamamos de “condições de trabalho”. Essa natural obsessão por saber o que se fará, diretamente, para a mudança de nossas vidas – algo que ocorre também em outras carreiras públicas – nos faz cometer um erro estratégico enorme, no que diz respeito ao alcance daqueles objetivos. Minha tese é: devemos cobrar e votar pela segurança pública, e não APENAS pela polícia, dado que somos uma parte do problema a ser resolvido, uma das essenciais, mas apenas uma parte.
Confesso que fico um tanto invejoso das intervenções que algumas organizações de classe fazem em questões de alta repercussão, como a Ordem dos Advogados do Brasil. A OAB certamente é um ícone de entidade que, para além dos interesses meramente classistas, entendeu que pode e deve ter um papel fundamental nas discussões locais e nacionais que se referem a direito e justiça. A Ordem é respeitada e tem poder de voto e veto em questões cruciais que definem a trajetória do país.
Ressalvadas as características administrativas próprias da OAB, sua história e composição, me pergunto por que os policiais brasileiros não possuem entidades com tamanho gabarito e credibilidade. Longe de mim defender a criação duma Ordem dos Policiais Brasileiros – somos muitos, exercendo funções distintas, e com peculiaridades que variam de acordo com a instituição a que pertencemos. Por ora, defendo entidades locais fortes, opinativas, preocupadas com a segurança pública, mas sempre traçando as perspectivas de intervenção pautadas na visão policial que representa.
Tomemos como exemplo a Proposta de Emenda Constitucional de número 300, a PEC 300. Trata-se de uma medida que agrada todos os policiais brasileiros, mas não conseguimos angariar suficiente apoio e mobilização do público não-policial. Sim, existem as questões políticas, as definições “editoriais” da mídia etc. Mas pensemos o quanto nossa causa sensibiliza a sociedade. A princípio, aumento salarial não passa de mera ambição capitalista aos olhos do leigo – seja para que classe for.
Se tivéssemos organizações fortes, opinativas e críticas em todos os aspectos que envolvam a segurança pública, de modo que a sociedade as percebessem desse modo, o respeito à causa policial seria outro. Ou alguma associação policial discute seriamente a relação entre Direitos Humanos e atividade policial, por exemplo? Qual organização superou o discurso classista, de modo que não fôssemos vistos apenas como interessados em ganhos particulares, isolados dum projeto consistente de mudança da segurança pública?
Talvez esse seja um problema maior do que imaginamos, um problema do próprio sindicalismo, existente em todas as classes trabalhadoras – e aí nos vemos num complexo labirinto. Porém, acredito que individualmente, através do voto, podemos cobrar de nossos candidatos uma segurança pública melhor, convencendo nossos amigos e parentes que para isso não podemos ter policiais se desdobrando em “bicos”, muitas vezes degradantes e arriscados. Precisamos de policiais motivados, tendo condições dignas para exercer seu ofício, com seus direitos respeitados, um pressuposto básico para o respeito aos demais cidadãos. Seria um bom início para convencer a todos que uma política de segurança eficiente no Brasil passa por alguns benefícios à classe policial.
PS: Este post é ilustrado com uma montagem feita na pintura “Operários”, de Tarsila do Amaral.
O Especial Eleições 2010 e Segurança, é um espaço onde analisaremos as práticas políticas, as promessas, as propostas e as tendências no campo da segurança pública para o próximo pleito eleitoral. Naturalmente, sem discutir candidatos nem partidos, mas sempre focando nas idéias. Participe!
http://abordagempolicial.com/2010/04/votar-pela-policia-ou-pela-seguranca/
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